A minha vida está negra. Meu dia está
nublado. Por quê? Oras, oras, são as nuvens cor de chumbo, que vêm descendo
sobre o morro como lagartixas, escorregadias, soturnas – igual àqueles filmes
ingleses, de terror, sabe? Idêntico às cenas de pânico do Hitchcock. Enfim,
nuvens quase negras, vento frio, garoa, uivos que as frestas das janelas
emitem, arre! Lembra o meu avô que em dias assim sentava-se ao bancorete na
varanda, prostrado de tanta desolação, acendia um cigarro atrás do outro,
jogando a fumaça para o alto, a bagana para outro, até virar nuvem também. Bem
diferente do tempo ensolarado, céu azul, nuvens brancas que governavam o dia do
velho. Nessa hora, para evitar que a fumaça do cigarro sujasse o céu, ele
trocava o fumo por um copo de cachaça. Como sabia viver o meu avô! (06/09/2013)
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A ditadura está de volta! A atitude do
Estado ante as manifestações (que vieram para mudar) indica: a ditadura está de
volta. A nossa pseudo-democracia apoia a reação violenta das polícias. As medidas
do Governo, deputados e vereadores indicam – a ditadura está de volta! Tudo tem
o amém das instituições, da Autoridade Federal, Estadual e Municipal. A imagem
da violência de hoje de repente se mistura com documentários em preto e branco
dos anos 1960! Vejam! São perfeitamente iguais, são exatamente as mesmas, são
impecavelmente ditatoriais. A ditadura está de volta! Antes era Gás
Lacrimogêneo, porrada de cassetete de madeira, bordoada de espadas
enferrujadas. Hoje é Spray de Pimenta, Bala de Borracha, Pistola de Choque
Elétrico. Os dias de ditadura estão voltando com novos sabores. Preciso me
preparar, atualizar o cardápio. Vou já-já ao camelódromo comprar a minha
máscara. (07/07/2013)
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Anarquista não é baderneiro. O
anarquismo é uma forma de direito político, desconhece a direita e a esquerda,
opta pela rebelião para expressar sua meta: o fim da sociedade hierárquica. Por
isso toda insurgência contra o sistema, contra a opressão tem nome de anarquia.
Aqui, as manifestações contra o Estado – corrupto, opressor, controlador, nazifascista
– há de provocar sempre o ódio e a convulsão. Dentro da desordem está o
quebra-pau, a arruaça, o vandalismo. Em tempos de corrupção deslavada a corja
reconhece o corruptor na instituição que depreda. O ataque é ao lucro
insaciável, à banca federal de jogos, ao abandono deliberado e institucional da
saúde, da educação, da cidade e do cidadão – tudo que era marginal e criminoso hoje
é institucional, governamental. Indivíduo, sociedade e liberdade – eis o
fundamento do anarquismo. (08/09/2013)
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A bailarina italiana Marietta Baderna chegou
ao Rio de Janeiro, tinha 21 anos e prestígio. Logo Marietta trocou o pas de deux pela umbigada dançada pelas
negras, atitude mal vista pela soçaite da época, que passou a discriminá-la. Maria
se declarou antimonarquista e liderou greves contra empresários que não pagavam
os empregados. Perdeu o apoio da imprensa (que em 1849 a recebeu com flores), dos
teatros, dos próprios colegas. Para sobreviver virou dançarina de teatro de
revista e quando ela saía de cena, o populacho exigia sua volta batendo pés,
fazendo arruaça, quebra-quebra, gritando: Baderna! Baderna! Boa herança
deixaram os rapazes do século XIX! (09/09/2013)
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Clubes e Associações de Baderneiros
vieram pra ficar. Não sou baderneiro e me falta tempo pra fazer o vestibular. No
tempo da ditadura fiz treinamento no Calabouço, na Faculdade de Filosofia, no
Largo do CACO, na Central do Brasil, no Largo de São Francisco, na Cinelândia –
que não era só lugar de viado (ainda não existia gay). Mas fiz a minha
inscrição e sou a favor de manifestantes mascarados. Por que ninguém fala da
POLÍCIA MASCARADA? Andam com TOUCAS NINJAS pra lá e pra cá e nada. Passou na
TV: na reconstituição do caso Amarildo tinha policial mascarado. Ora bolas! E
dos DEPUTADOS MASCARADOS, ninguém fala? Protegidos pelo VOTO SECRETO evitam o
repúdio e a rejeição do povo, né mesmo? (10/09/2013)
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Crescem as críticas sobre o uso de Armas Químicas na guerra. O EUA usou esse
argumento para atacar o Iraque e intervir na Argélia, Tunísia, Líbia, Iêmen –
sempre e sempre o mundo árabe – em que Obama (Democrata) repete Bush
(Republicano). Reportagens constataram o uso de Armas Químicas pelos rebeldes (armados por EUA/Israel), na Síria. O
arauto das críticas (EUA) usou Gás
Mostarda na Europa, jogou a Bomba Atômica
no Japão e encheu o Vietnã de Napalm?
Tudo isso é Arma Química. ATENÇÃO! Também
é Arma Química: a Bomba de Efeito Moral, o Gás Lacrimogêneo, o Spray de Pimenta e outros temperos que nossa
polícia usa contra os manifestantes. Fora as armas químicas! – aqui no Brasil
também... (11/09/2013)
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Velhice. Lá vai Wilson na calçada
coberta de folhas vermelhas de amendoeira, enferrujadas como seus joelhos. Vendo-o
caminhar, ombros pesados, cabelos brancos, pele enrugada, vi que estava velho, a
amendoeira está velha, eu estou velho. Por que a gente custa admitir isso? É
que a cabeça não envelhece. Mas os jovens começam a te chamar de Tio, no ônibus
te oferecem lugar, te chamam de “coroa”. Quando alguém começa a gritar: Vovô!
Vovô! A gente está velho quando os amigos passam carregando o mundo nos ombros,
joelhos dobrados, olhar distraído para tudo, sem vontade de dar um abraço. Ou
quando se tem dúvida entre o Viagra, Cialis ou nenhum deles. Êita mundo doido!
(13/09/2013)
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Zé Andrade Arte postou:
“Creio
que devemos ler só os livros que mordem e espicaçam. Se o livro que lemos não
nos desperta com uma porrada na cabeça, de que adianta lê-lo?” (Franz Kafka: carta a Oskar Pollak, 1904). Mas,
ora bolas, aqui cabe bem o proverbial “Poema Enjoadinho” de Vinícius de Moraes:
“Filhos... Filhos? Melhor não tê-los! Mas
se não os temos, como sabê-lo?” – Então, livros, se não os ler, como sabê-los
bons ou não, né? Ademais, levar porrada de livro na cabeça... não sei não... se
for o Ulisses de James Joyce, mais que despertar, vai doer. Se for o Atlas
Klencke então, vai matar! (14/09/2013) Agora, olha só que beleza o poema do
Vinícius de Moraes completo:
Poema
enjoadinho
Filhos...
Filhos?
Melhor não tê-los!
Mas se não os temos
Como sabê-lo?
Se não os temos
Que de consulta
Quanto silêncio
Como os queremos!
Banho de mar
Diz que é um porrete...
Cônjuge voa
Transpõe o espaço
Engole água
Fica salgada
Se iodifica
Depois, que boa
Que morenaço
Que a esposa fica!
Resultado: filho.
E então começa
A aporrinhação:
Cocô está branco
Cocô está preto
Bebe amoníaco
Comeu botão.
Filhos? Filhos
Melhor não tê-los
Noites de insônia
Cãs prematuras
Prantos convulsos
Meu Deus, salvai-o!
Filhos são o demo
Melhor não tê-los...
Mas se não os temos
Como sabê-los?
Como saber
Que macieza
Nos seus cabelos
Que cheiro morno
Na sua carne
Que gosto doce
Na sua boca!
Chupam gilete
Bebem shampoo
Ateiam fogo
No quarteirão
Porém, que coisa
Que coisa louca
Que coisa linda
Que os filhos são!
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Transmiti-las ao vivo deu alto Ibope às
sessões do STF no julgamento do mensalão. Audiência puxada pela presença do
Ministro Joaquim Barbosa, gigante no pleno, mas fisicamente abatido por
infernal dor na coluna. O padecimento se agravou após o Ministro pronunciar as
sentenças, pois, é certo, o nome dele foi parar na boca do sapo, nas
encruzilhadas, nos Ebós, nos rogos e padês aos Exus. Quem imaginaria, porém,
que todo aquele esforço iria esbarrar no voto agradecido dos Ministros nomeados
por políticos? Não dá mais para assistir a TV Justiça sem sentir ignomínia,
desonra, opróbrio – porque hoje o Brasil todo sabe que nem mesmo a Suprema
Corte escapou aos tentáculos da corrupção que assola o país. (15/09/2013)
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Deixar pra amanhã não é uma boa ideia na
idade em que a gente tá virando criança de novo. Foi assim que perdi o mano
mais velho, Antonio, de Mato Grosso do Sul. Ele mandou mensagem: “Quando você
vem ver o teu irmão? Amanhã?” Foi mal, foi chato. Tivesse ido, ele não faria a
inevitável viagem assim, sem combinar. Ninguém morre na minha presença: não
permito! Hoje recebi a visita do outro irmão, Roberto (vide fotos), de Cuiabá.
Faz dois anos que vinha deixando pra nos visitar amanhã... Trouxe pequi, mel de
abelha, um abraço de irmão – que foi o mais gostoso. Queria que ficasse uma
semana, mas passou só alguns minutos! Como castigo não deixei cantar as músicas
que compõe – e porque desafina pra caralho! Boa viagem, mano! (15/09/2013)